NA FONTE DE VINHO, FAÇA UM BRINDE A SAN VEREMUNDO DE IRACHE

Você já ouviu falar a respeito da fonte de vinho do Caminho de Santiago? Não, ela não é uma lenda, existe mesmo! Posso garantir. Fica em Ayegui, apenas 2km depois de Estella, e é magnifica, decorada com conchas, cruz de Santiago e o brasão da vinícola. Esse cantinho da Navarra já era conhecido, desde o séc XII, como “terra de bom pão e excelente vinho” conforme descrito no Codex Calixtinus.

Aproveitando…. Vou abrir um pequeno parágrafo sobre o Codex Calixtinus, pois você vai ouvir falar muito sobre ele, e logo em seguida volto para o tema de hoje. Se você já sabe sobre o que se trata é só pular o parágrafo seguinte. Combinado?

Codex Calixtinus ou Códice Calixtino é uma coletânea de manuscritos, redigidos entre 1130 e 1160. Está divido em 5 livros onde é possível encontrar textos litúrgicos, hinos, descrições de milagres atribuídos a Santiago, relatos sobre a evangelização do apóstolo, e histórias das aparições de Santiago à Carlos Magno durante sua empreitada pela Espanha. Entretanto a parte mais famosa do Códice Calixtino é o quinto livro, que é o Guia do Peregrino de Santiago de Compostela (Iter pro Peregrinis ad Compostellam) conhecido como o primeiro guia do caminho, cuja autoria foi atribuída ao monge cluniacense francês Aymeric Picaud. Nesse texto é possível saber detalhes importantes como a qualidade das fontes de água, onde dormir, cidades por onde passa, cultura do povo, santuários, enfim, tudo que o peregrino da época precisava saber para fazer o caminho.

Codice Calixtino - Foto de Alvaro Ballesteros - Site Vive el Camino
Codice Calixtino – Foto de Alvaro Ballesteros – Site Vive el Camino

Voltando a Fonte de Vinho…

Trata-se de uma deliciosa cortesia das Bodegas Irache, que oferecem o seu vinho aos peregrinos, seguindo a tradição dos monges beneditos, que também os recebiam assim.  Quando eu cheguei na tal fonte eram 9h40 da manhã, e o local estava cercado de peregrinos incrédulos com essa benevolência. No alto da parede uma placa dizia: “ Peregrino, se quiser chegar a Santiago com força e vitalidade deste grande vinho tome um gole e brinde pela felicidade”.

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O grupo de peregrinos debatia sobre um grande dilema ético, social e salutar, algo de grande interesse geral: Tomar vinho naquela hora da manhã. Como esse assunto também era do meu interesse eu entrei no debate. O coreano disse que no país dele já eram 4 horas da tarde, por isso ele não via problema em beber o vinho gentilmente agraciado pelas Bodegas Irache. Eu argumentei, que estava com muita dor no joelho e precisava de força e vitalidade para chegar a Santiago, conforme dizia a placa. O australiano usando do mesmo artifício disse que a felicidade merecia ser brindada. E assim, pouco a pouco cada um encontrou um bom motivo pra se esbaldar na famosa fonte do vinho, mesmo àquela hora da manhã.

Desculpem pela minha “taça” completamente inadequada / lo siento por mi “vaso” completamente inadecuado / Sorry for my completely inadequate “cup”.
Desculpem pela minha “taça” completamente inadequada!

Na fonte existem duas torneiras, uma de vinho e outra de água, essa segunda ficou totalmente esquecida, coitada. Mas atenção, nem adianta levar o seu garrafão de 5 litros para encher na fonte, isso não é permitido, o local inclusive tem câmeras para vigiar os eventuais espertinhos.

O Monastério de Irache

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Bem ali, no outro lado da rua está o Monastério Beneditino de Irache (Iratxe em Basco), que começou a ser construído na segunda metade do séc XI, e a ele foi sendo acrescentado outros edifícios, por isso é possível identificar os estilos românico, renascentista e barroco. Foi o primeiro hospital de peregrinos de Navarra (os hospitais eram um misto de hospedaria com local de cuidados médicos e religioso). O conjunto que compõe o monastério, também já abrigou uma universidade, serviu de hospital de guerra – o exército de Napoleão passou por lá,  e depois foi novamente utilizado com essa finalidade na segunda guerra Carlista – e posteriormente se transformou em colégio religioso. Atualmente é possível visitar suas dependências, que aliás, estão muito bem conservadas, dá para conhecer até mesmo o claustro, uma vez que o mosteiro está desocupado desde 1985.

A lenda de San Veremundo ou Bermudo

A lenda conta sobre o abade de Irache, San Veremundo, que viveu entre 1056 e 1098. Segundo a lenda, ele costumava levar comida escondida para os peregrinos famintos que paravam no hospital, mesmo que isso fosse contra as regras da congregação. Para ocultar os alimentos, ele os escondia debaixo de seu hábito. Quando os outros irmãos o interrogavam sobre o que ele levava, obrigando-o a levantar o hábito, a comida se transformava em flores ou lenha.

Guia C Primitivo

Além disso, outra lenda sobre San Veremundo diz que ele fez brotar vinho de uma fonte próxima ao monastério, especialmente para servir aos peregrinos. Essa história adiciona um toque mágico à sua dedicação em cuidar dos viajantes que percorriam o caminho.

#IloveSanVeremundo

Essas lendas demonstram o caráter compassivo e altruísta de San Veremundo, tornando-o uma figura venerada e lembrada pelo seu amor aos peregrinos.

Como ninguém é perfeito, San Veremundo também já teve seus momentos de fúria, certo dia ele recebeu um grupo de peregrinos no monastério, e perguntou o que eles haviam visto pelo caminho, os peregrinos provavelmente porque estiveram distraídos, não souberam responder. Veremundo ficou muito chateado com a indiferença diante das belezas criadas por Deus, e bravejou: “Veré Mundo!”, e nesse momento os peregrinos se transformaram em moinhos de vento, girando constantemente, mas sem chegar a lugar nenhum.

As variantes de Ayegui

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Depois de ter o seu corpo fortalecido pelo vinho da fonte e conhecer o Monastério de Irache,  é hora de pegar a estrada e seguir o caminho. Nesse local você terá duas variantes, a primeira é seguindo em frente, vai passar por Montejurra e Luquin, nessa alternativa você vai encontrar ladeiras e simpáticos bosques, quem optou por esse caminho me falou muito bem sobre ele. A segunda opção é pegar a alternativa da direita que vai pôr Azqueta e Villamayor de Monjardim, nessa alternativa o caminho passa por videiras e plantações até chegar em Azqueta, cidade onde viveu Pablo Sanz Zudaire o famoso Pablito das Varas, que desde 1986 fazia cajados de aveleira e oferece aos peregrinos que passam por lá. Infelizmente essa figura icônica e altruíta do Caminho deixou esse plano em 18 de setembro de 2022.

Qual dessas duas é a melhor opção? Certamente será a que você escolher, no caminho não tem melhor ou pior, todas as alternativas vão te proporcionar incríveis experiências, portanto elege a que te parecer mais agradável, a que o seu coração mandar,  e siga em frente sem se arrepender, e não se preocupe se os seus amigos resolverem ir pelo caminho diferente do seu, pois as duas trilhas vão se juntar antes de chegar a Los Arcos.

Ultreya, suseya y buen caminho.

SE TIVER PIQUE, VISITE:

Monastério de Iratxe: É possível visitar a igreja românica, o claustro, a torre e todas as outras dependências construídas entre os séculos XI,  XVI e XIX.  A entrada é grátis, mas pelo que vi só está aberta no verão de quarta a domingo de 10h00 às 13:15 e das 16h00 às 19h00. Veja aqui.

Museu do Vinho: É o edifício mais antigo da bodega, foi construído em 1891 e tem uma coleção de mais de 200 peças antigas relacionadas ao vinho. O museu fica aberto nos finais de semana das 10h00 às 14h00 e das 16h00 às 19h00, no inverno fecha as 18h00, e a entrada é franca. Veja aqui.

Bodegas Irache: é possível visitar de segunda à sábado somente ao meio dia, não tem outro horário, por isso é recomendável fazer reserva através do e-mail irache@irache.com. Veja aqui.  

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9 Replies to “NA FONTE DE VINHO, FAÇA UM BRINDE A SAN VEREMUNDO DE IRACHE”

  1. Eudes Barros says: Responder

    Olá!
    Algum dia irei fazer o caminho, mas, que caminho foi esse que passa pela Bodega Irache? Começou em que cidade? Grato

    1. Denise Santos says: Responder

      Bom dia Eudes. Vai mesmo, tenho certeza que vai adorar.Eu comecei em Saint-Jean-Pied-de-Port.
      A bodega fica no Caminho Francês, logo depois de Estella, coisa de uns 3 km já chega no Monastério e Bodegas Irache, um em frente ao outro.

  2. Rafael Arpelau says: Responder

    Posso acampar ao lado da fonte ? srsrsrs

    1. Denise Santos says: Responder

      Kkkkkk acho que pode, mas não vai adiantar muito, pq a fonte é monitorada por câmera.

  3. I spent a great deal of time to find something like this

  4. Parabéns pela iniciativa! Compartilhar suas experiências com àqueles que ainda sonham em percorrer o Caminho de Santiago de Compostela, à torna muito especial. O site, o blog, estão em sintonia e trazem tudo de que preciso para sonhar em realizar esta peregrinação. Também como você, não sei explicar o por quê desta imensa vontade de percorrer o Caminho, entretanto, por que querer encontrar uma explicação, não é mesmo?

    1. Denise Santos says: Responder

      Exatamente Karine. O Caminho é para ser sentido e não explicado. Espero que você encontre tudo o que precisar aqui no blog. E se tiver alguma dúvida é só escrever, se eu puder ajudar ficarei feliz.

  5. Adorei as dicas dos vinhos…

    1. Denise Santos says: Responder

      Incrível né!

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